Quando vieram ao mundo, eram de uma feiura que chegava a comover: o corpo pelado, a pele enrugada, os olhos cerrados. Mas poucos bebês foram tão esperados como as duas ararinhas-azuis que nasceram no interior paulista, em endereço mantido em sigilo. São as primeiras geradas no Brasil nos últimos 14 anos, quando a espécie foi considerada extinta na natureza, com o fim do último exemplar, em Curaçá, na Bahia.

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Ararinha-azul. Foto: ACTP.
Os bebês feiosos em nada lembravam a ararinha Blu, famosa personagem do filme Rio. Nasceram com 15 gramas, mas com pouco menos de dois meses já haviam ganhado corpo e as penas azuis que as tornam tão valiosas no mercado paralelo - cada uma chega a valer 100 mil (cerca de R$ 325,4 mil).

O nascimento dos filhotes, ainda sem nome, foi fruto de um esforço de instituições do Brasil, da Alemanha e do Catar que integram o Projeto Ararinha na Natureza, coordenado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, com patrocínio da Vale.

As ararinhas-azuis eram encontradas apenas na Caatinga, em Curaçá. Além dos predadores naturais, como gaviões, enfrentaram dificuldades para reprodução: foram expulsas por abelhas do oco das árvores onde faziam ninhos. Mas foi a captura para o tráfico a causa de seu desaparecimento na natureza. Em 1991, havia um animal silvestre, macho, monitorado até 2000 - um dos últimos registros da ave foi feito pelo fotógrafo Luiz Cláudio Marigo, especializado em natureza, que morreu neste ano ao enfartar na frente do Instituto Nacional de Cardiologia e não conseguir socorro.

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Recém nascido de ararinha-azul nascido no Brasil.
Foto: Eny Miranda/Divulgação
Sobraram 90 ararinhas em cativeiro - 70 delas no Catar, 9 na Alemanha e 11 no Nest, criadouro científico no interior de São Paulo cadastrado no instituto, cujo endereço não é divulgado para evitar que atraia caçadores e traficantes de aves. Geneticamente mapeadas para evitar a consanguinidade que ameaça ainda mais a continuidade da espécie, elas são trocadas entre instituições em tentativas de formarem o par ideal. “Com uma população tão pequena, os indivíduos são todos aparentados. Os testes genéticos apontam o pareamento ideal. Mas o que em laboratório parece ideal, às vezes não dá certo. A gente tenta por anos, mas os casais não se formam. Ararinhas-azuis são monogâmicas, têm de ter uma química”, explica a analista ambiental do ICMBio Patrícia Serafini, coordenadora do programa de cativeiro.

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Filhote de ararinha-azul nascido no Brasil. 
Foto: Eny Miranda/Divulgação
No caso das aves que estão no Nest, Blu e Flor, a união indicada pelos testes funcionou. Ela começou a pôr ovos. No início, inférteis, que os tratadores retiraram para não interromper o processo de reprodução. Foram três posturas, oito ovos - dois vingaram. Pai e mãe cuidam dos bebês, que passaram os primeiros 20 dias no ninho. Ricardo José Garcia Pereira, docente de reprodução de aves da Universidade de São Paulo (USP) e consultor do projeto, explica que a inseminação artificial é rara por causa dos efeitos da consanguinidade. “Psitacídeos, como as araras, têm 300 milhões de espermatozoides por mililitro. Na ararinha-azul encontramos apenas 3 milhões. É pouco e de baixa qualidade.”

O projeto Ararinha na Natureza prevê que os animais sejam reintroduzidos em Curaçá em 2021. Para isso, é preciso ter 20 aves com 1 ano, vindas de vários criadouros. Até a meta ser atingida, será feito um trabalho de conscientização com a população de Curaçá e criada uma Unidade de Conservação na região em que as ararinhas serão soltas.

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